Houston, we have a "financial" problem!

Autor: Marcel S. Cabral

Prever cotações, é possível?

Talvez essa seja uma das questões de maior relevância quando pensamos em negociar ativos de renda variável, ações por exemplo.

A pergunta parece até um exercício de futurologia, tema sobre o qual já escrevi a respeito tempos atrás e você pode consultar o texto aqui.

Saber com precisão qual será o preço de um papel em uma data futura certamente traria resultados financeiros impressionantes a quem se aventura nesse mercado.

Mas vale lembrar, estudos indicam que o mercado é probabilístico, ou seja, o comportamento dos preços tende a ser aleatório. Não há exatidão quanto ao cenário em determinada data futura.

Mas então, por que escrever sobre previsão?

A motivação vem de um artigo que li esses dias, chamado: “Stock Price Forecasting and Hypothesis Testing Using Neural Networks”, escrito por Kerda Varaku, professora assistente da Rice Universty, universidade localizada nos arredores de Houston.

Nessa famosa região, conhecida mais pelas decolagens aeroespaciais do que por outras áreas, essa professora resolveu pesquisar o comportamento dos preços de ações usando tecnologias mais recentes aplicadas não só a esse mercado.

Sabemos bem que os conhecimentos computacionais hoje fazem parte da estrutura dos sistemas financeiros, mas mais que isso, contribuem também com as tomadas de decisões nesse ambiente.

A discussão sobre a predição de preços, com ou sem recursos computacionais, gera acaloradas discussões.

Para exemplificar, falemos de uma das principais teorias de finanças, a Hipótese dos Mercados Eficientes (HME). Em suma, ela diz que o mercado precifica quase que de imediato as novas informações sobre determinado ativo, não sendo possível se obter retornos anormais com o uso de informações públicas ou privadas.

Eugene Fama, que foi o autor dessa tese, já reviu essa ideia, sinalizando até que há uma correlação positiva entre os retornos das ações (entenda-se variação de preços) e alguns indicadores, tais como o Dividend Yield, o Book-to-market ratio e o Earning-Price,  ou seja, mais sobe a cotação dos papéis quanto mais alto são os dividendos, o valor patrimonial e o lucro por ação.

Isso implica dizer que o uso de informação histórica (pública) pode gerar retornos anormais, contradizendo a HME.

Essa é uma das motivações da autora em estudar a predição dos preços.

Outras motivações são reveladas por ela nos comentários sobre trabalhos diversos que utilizam distintas técnicas na tentativa de predizer os preços, como, por exemplo, no uso do modelo linear de mínimos quadrados (a regressão em si), do bootstrap (uma técnica de reamostragem), do processo auto-regressivo de primeira ordem (uma técnica de séries temporais) e da variação desse último, conhecido como auto-regressão vetorial multivariada (o intitulado Mutivariate VAR).

Distintas abordagens, mas com um objetivo comum: predizer o preço futuro.

Mesmo o uso dessas técnicas, que partem da premissa do mercado ser aleatório para prever comportamentos dos preços, é questionado. A dúvida sobre o fato do mercado ser ou não aleatório ainda persiste.

Mesmo assim, Kerda revela que apesar dos distintos modelos, das diferentes formas de corrigir vieses e das dificuldades em se resolver tais questões há um consenso entre pesquisadores de que o retorno das ações possui um elemento previsível.

Diante de todo esse cenário ela reforça o uso das redes neurais no âmbito dos mercados financeiros na tentativa de buscar padrões pensando em aplicá-los a um ambiente onde o comportamento dos fenômenos pode não ser linear.

O estudo que ela conduz, inclui dois modelos de redes neurais sendo o primeiro denominado RNN (Recurrente Neural Network) e o segundo Multilayer Preceptron.

Entender tais modelos em detalhes requer resgatar ou aprender conhecimentos que não se limitam aqui. Mas, em suma, as duas técnicas  criam uma arquitetura que busca aplicar às máquinas o modo como seres humanos aprendem.

Seu estudo demonstra que através dessas técnicas é provável que os preços históricos afetem os preços atuais, contradizendo, como vários outros trabalhos, a ideia de que o mercado é eficiente como retratou Eugene Fama em meados do século passado.

Agora, Houston revela mais um problema, só que dessa vez no universo das finanças!