Como a cultura afeta suas finanças?

Autor: Marcel S. Cabral

Provavelmente você já ouviu falar de cultura. Se é brasileiro talvez evoque à mente a ideia do “jeitinho brasileiro” como um aspecto cultural, retratado por determinados comportamentos que algumas vezes são questionáveis.

Bem, os anos passaram, os hábitos mudaram, mas o conceito de cultura permanece e envolve a ideia de um conjunto de valores, crenças e costumes que fazem parte de uma sociedade. Para exemplificar, pense em alguma coisa que você faz ou considera de extremo valor e é repetido (ou também considerado importante) por gente próxima a ti. A história do peixe com o rabo cortado que vai a panela exemplifica um pouco a ideia das crenças e, consequentemente, da cultura (se não conhece a história, dê uma “googlada”).

Mas qual a relação desse aspecto com finanças, né?!

Imaginando a resposta, talvez você pense sobre a relação de consumo que elas têm, sobre o hábito de investir das pessoas e outras questões financeiras. Tudo isso faz sentido, até porque retratam um pouco os valores, as crenças e os costumes que temos ao tomar tais decisões. Entretanto minha principal motivação para falar sobre esse tema vem de um artigo chamado Cultural Biases in Equity Analysis que foi publicado agora, em novembro, em uma das principais revistas de finanças do mundo, a Journal of Finance.

Como a tradução indica, existe um “viés cultural” que influencia os analistas de ações, que são aqueles profissionais com o objetivo de escrever relatórios indicando que papéis comprar/vender e qual a expectativa para cada ativo.  O trabalho, que foi desenvolvido por Vesa Pursiainen, uma pesquisadora de finanças lá da Universidade de St. Gallen, faz uma comparação entre os elementos culturais de analistas europeus. É certo que o foco da pesquisa está um pouco fora da nossa realidade, tanto pelo objeto da pesquisa (os analistas), quanto pela região observada (Europa), porém traz ensinamentos relevantes para avaliar o comportamento que temos diante dos investimentos.

Explicando alguns dos detalhes do trabalho (apenas para curiosidade), ela criou um indicador para medir a cultura dos analistas e avaliar como é essa relação com as opiniões que eles emitem sobre determinadas ações e descobriu que a cultura tem sim, impacto na opinião do analista. Agora, imagine você no papel de investidor e reflita quais crenças, valores e costumes está exposto e de que modo elas influenciam suas decisões financeiras?

Se não tem uma resposta certa, provavelmente é porque isso não está claro na sua mente. Algo natural, até porque pode ser uma situação subconsciente.

Agora, pense na poupança, um produto que sabemos que não é a melhor opção de investimento. Por quê as pessoas colocam recursos nela?

Talvez as crenças que foram formadas por anos de propaganda (ela existe desde o império) condicionam as pessoas a investir os recursos nessa alternativa. É sabido que temos opções mais vantajosas que ela (títulos públicos são o exemplo disso), mas nos livrar de tais crenças, valores e costumes que limitam nosso avanço como investidores em termos de sociedade e ter atitudes que ampliem nossa ação como investidores, não é uma questão simples.

Mudanças geram impactos, por vezes são doloridas e novos comportamentos sempre enfrentarão resistências. Kurt Lewin (um renomado psicólogo) já propôs um processo para facilitar que as mudanças tenham êxito, que envolve o fato de você descongelar a situação atual, provocar o movimento para a mudança e avançar com o recongelamento. Vale a pena pesquisar um pouco mais sobre ele.

Agora, olhando para nossa realidade, como um país, realmente precisamos avançar muito no que diz respeito aos investimentos. Afinal somos 210 milhões de habitantes, com cerca de 120 milhões que tem condição de gerar renda (e, portanto, podem investir), entretanto só 4 milhões, ou aproximadamente 3%, deu um passo adicional para avançar com os investimentos. É certo que só uma pesquisa vai apresentar os reais motivos dessa situação, mas certamente as questões culturais contribuem para impedir esse avanço.

Porém, você que chegou até aqui certamente já avançou, entretanto, o que mais tem feito para eliminar as questões limitantes e contribuir para que a sociedade melhore a qualidade de vida financeira?