Autor: Marcel S. Cabral
Em uma conversa de almoço na semana passada, falando sobre o mercado, comentaram: Bolsa é cassino (poderia também ser casino)!
Não sei bem se é uma percepção já existente ou se pela conversa foi despertada essa visão.
Mas será mesmo que Bolsa de Valores é um Cassino?
Para sabermos se isso é verdade precisamos entender o funcionamento de cada mercado.
Falando de mercado, a definição usual é de que ele é um local onde os agentes econômicos trocam bens ou serviços por unidades monetárias. Nesse conceito, tanto a Bolsa de Valores como um Cassino podem ser definidos como mercados.
Na Bolsa, trocamos nossos recursos para comprarmos produtos financeiros, tais como ações, opções, títulos de créditos e outros mais. A decisão do que comprar e em que momento fazer isso de modo a minimizarmos nossos riscos e maximizarmos nosso potencial de ganho, requer levantar dados, analisar variáveis, acumular informações e tomar decisões, ou seja, há um trabalho intelectual por trás. Algumas ferramentas como a análise técnica, o value investing, o growth investing, o tape reading, entre outras, auxiliam parte desse processo.
No Cassino qual seria o bem ou serviço oferecido? O produto negociado são os jogos de azar. Ele praticamente vende apostas, que alguns consideram como lazer. Algumas apostas, tais como roletas, dados e até alguns jogos com cartas, não requerem o levantamento e análise dos dados, há simplesmente uma decisão considerando a probabilidade de determinado evento acontecer. E mesmo que haja a preocupação em saber quais foram os resultados anteriores, se não viciados, os dados sempre terão a mesma probabilidade de apresentar os resultados esperados.
Ainda mais, no Cassino, a depender do jogo, sua ação não influencia o resultado. O que sua ação pode provocar é influenciar a partilha dos ganhos ou prejuízos. Por outro lado, sabemos que na Bolsa de Valores, vários players são responsáveis em ditar os rumos do preço de um papel.
No ambiente legal, a exploração dos jogos de azar no Brasil ganhou relevância recentemente com o lançamento da frente parlamentar pela aprovação do marco regulatório dos jogos no país, mas ela ainda é proibida desde o decreto-lei de 1946, sancionado pelo presidente Eurico Gaspar Dutra. Já as operações em Bolsa de Valores adquiriram sua relevância através da lei 6385 de 1976 que criou a Comissão de Valores Mobiliários, embora já fossem feitas em tempos mais antigos.
Talvez um fator próximo entre um mercado e outro seja na gestão de risco, algo fundamental quando se trata do uso de recursos financeiros.
Quando falamos de Bolsa de Valores, provável que a classificação de risco mais proeminente seja a do risco de mercado, que trata da oscilação dos preços em uma direção contrária a qual se tem uma posição, que pode ser exemplificado na situação de quando compramos PETR4 a R$ 17,00 hoje e amanhã ela passar a ser negociada na casa dos R$ 14,00 em função de um acontecimento extraordinário.
Nessa situação, profissionais de mercado têm métricas para definir se eles mantêm a posição, ou se executam a operação com prejuízo evitando maiores perdas no caso de uma queda mais acentuada, preservando, assim, seu capital.
No Cassino, o apostador, ao perder dinheiro em um jogo, pode tomar a decisão de continuar apostando ou parar e também preservar seu capital.
Certamente a ideia de preservar o capital é o elemento comum mais relevante entre esses mercados.
E vale lembrar que, falando da Bolsa, a existência de um processo que exige um mínimo de esforço intelectual e permite o uso de algumas técnicas já evidencia que quem atua neste mercado não está simplesmente apostando por apostar, ou seja, as decisões são resultados de um trabalho valoroso, mesmo que hajam os vieses já constatados pela ciência.