Realizar prejuízo ou não?

Na sexta passada fui à uma palestra sobre negociação e encontrei um amigo que já não via há anos. Formados pela mesma faculdade, trabalhamos, há mais ou menos 10 anos atrás, na mesma empresa, mas em setores diferentes.

Na atualização da conversa, caímos no tema de meu negócio: Bolsa de Valores. Papo vai e papo vem, ele relatou um caso que enfrentou, que é muito parecido com o que eu e vários traders enfrentamos no dia a dia. O dilema é o seguinte: Realizar ou não o prejuízo?

Antes da queda acentuada da bolsa tempos atrás, ele investiu recursos em uma famosa blue chip, a PETR4. O índice derreteu e o papel começou a oscilar para baixo num ritmo forte. Incomodado com a situação, assumiu as rédeas e disse ter conseguido sair quase que no zero a zero. Confessa que entrou sem conhecimento, tomou um susto e se afastou um pouco desse mercado, participando hoje, no máximo, através de aplicações via fundo de investimento.

Encontrar ele e escutar essa história foi um caso com pouca probabilidade de acontecer. Além de ter muita gente no evento e ver alguém conhecido ser quase como achar uma agulha num palheiro, na mesma semana estava relendo uma parte da famosa obra de Kahneman envolvendo o capítulo “De olho no placar”.

O escopo do texto do psicólogo é falar de que, para aqueles que a renda não coincide apenas com a sobrevivência, as motivações dos que buscam mais dinheiro não são apenas econômicas. Kahneman afirma que o “dinheiro é um substituto para pontos em um uma escala de autoimagem e realização” e, que as recompensas, punições, promessas e ameaças são basicamente itens de um placar que estamos permanentemente de olho.

Assim sendo ele apresenta um caso clássico de como é que podemos nos comportar diante de situações de potenciais perdas e ganhos.

Um dos exemplos que ele mostra lembrou o caso do meu amigo. Kahneman nos faz imaginar a situação de um investidor que precisa pagar o casamento da filha e para isso tem duas opções, vender a ação A, com um ganho de 5 mil, ou vender a ação B, perdendo 5 mil. As ações tem se mantido estáveis nas últimas semanas. Diante disso qual ação estaríamos mais propensos a vender?

Pesquisas mostram que a maioria das pessoas tende a vender a ação ganhadora e uma das explicações para isso pode ser encontrada no fato de que o problema pode ser visto como uma situação de dar prazer ao indivíduo. Nesse caso, seria mais prazeroso sentir o ganho de vender a ação vencedora ao invés do sofrimento de vender a ação perdedora.

Usando de termos próprios, o premiado Nobel relata que essa situação recebeu o nome de efeito disposição e é um caso de enquadramento estreito. Exemplifica que um agente racional certamente teria uma visão mais ampla vendendo a ação com menor probabilidade de ir bem no futuro.

Prorrogar a realização de prejuízos como medida de prorrogar sofrimentos é um comportamento não sustentável no mercado. Isso cabe para várias estratégias operacionais, incluindo operações de day-trading.

O sucesso na bolsa de valores começa pela capacitação técnica e passa por questões de controle emocional. No exemplo do meu amigo, embora assumindo que faltou um pouco dessas questões, a reação foi rápida e certamente minimizou maiores prejuízos.

O legal disso tudo é que apesar do susto ele me disse que quer aprender mais e mais.

E dito isso, a mensagem que fica é: não prorrogue, comece já!